A recusa do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), presidente da Câmara dos Deputados, em pautar o Projeto de Lei (PL) da Anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023 tem relação com as pressões do Supremo Tribunal Federal (STF). A opinião é do advogado Sidney Stahl, ex-professor assistente de Direito Constitucional do ex-presidente Michel Temer (PMDB), na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
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“Esta iniciativa [de não pautar] está inserida em um contexto político e institucional complexo”, afirma Stahl, pós-graduado em Direito Constitucional e Tributário pela PUC-SP. a Oeste.

Ele questiona se a demora de Motta, em colocar o tema em votação no plenário, não tem relação com o fato de a Polícia Federal ter deflagrado a segunda fase da Operação Outside.
Tal operação investiga suspeitas de fraude em licitações e desvio de recursos públicos federais em Patos (PB), município governado por Nabor Wanderley, pai de Hugo Motta. O contrato investigado é anterior à sua gestão, mas foi executado durante sua administração.
“Embora nem Motta nem seu pai sejam formalmente investigados, a operação trouxe à tona conexões entre servidores municipais e empresários beneficiados pelos contratos, aumentando o escrutínio sobre a gestão local e as emendas parlamentares envolvidas”, ressalta o advogado.
“Isso pressiona Motta a apoiar a absurda interferência do STF no Legislativo e mostra que o STF está disposto a usar qualquer instrumento para ditar os rumos do país.”
A transformação do STF em um órgão em que temas políticos têm interferido, direta ou indiretamente, em decisões jurídicas não ocorreu de forma súbita, segundo Stahl. Para ele, como ilustra este caso da pauta da anistia, o órgão quer manter o “controle do discurso”.
Vários participantes daqueles atos têm sido punidos com severidade exagerada, segundo ele. Isto em função de uma série de ocorrências que transformaram o perfil do órgão.
“Uma série de eventos modificaram o perfil do STF, que até certo tempo atrás não atraía os holofotes como hoje”, ressalta o advogado. “O argumento mais repetido que ouço é que a TV Justiça, criada em 2002, tornou os ministros personagens públicos com forte exposição midiática. Mas eu não concordo que esse seja o único motivo.”
Nas décadas de 1980, 1990 e até os anos 2010, o perfil dos ministros, mesmo os oriundos da política, era marcado por uma discrição institucional maior, conforme diz Stahl.
“Um exemplo disso foi o ministro Nelson Jobim que foi deputado federal, ministro da Justiça e posteriormente ministro da Defesa depois de deixar o STF e atuou de maneira a afastar-se dos holofotes, mostrando um comportamento mais reservado nos tempos em que atuava no tribunal.”
A pressão da mídia sobre Jobim (ministro do STF entre 1997 e 2006), no entanto, já dava sinais de que iria surgir com força nos anos seguintes. O caso do Mensalão foi uma espécie de divisor de águas.
Medo do STF
O Mensalão foi um escândalo de corrupção revelado em 2005, que envolveu a compra de apoio político no Congresso Nacional durante o primeiro governo Lula. Um grupo de parlamentares recebia pagamentos mensais em troca de votos favoráveis ao governo.
“A exposição televisiva dos julgamentos só passou a ter importância a partir de 2012 quando do julgamento do Mensalão (Ação Penal 470) expondo os ministros e as suas divergências, quem acompanhou os julgamentos lembra das rusgas entre o ministro Gilmar Mendes e o presidente da corte, ministro Joaquim Barbosa.”
Joaquim Barbosa, então, passou a ser uma “estrela em ascensão”, um marco no combate à corrupção. Porém, a exposição do caso, cuja repercussão política era evidente, trouxe um novo papel para o STF, papel que nunca havia experimentado, julgar casos com repercussão político-social.
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A partir de 2014, com a Operação Lava Jato, prossegue o advogado, o STF passou a decidir casos diretamente ligados ao centro do poder político e econômico nacional. O tribunal acabou assumindo protagonismo na política, o que, para Stahl, tornou os ministros figuras frequentemente expostas e envolvidas em controvérsias públicas.
“Hoje os poderes têm medo do Supremo”, observa Stahl. “O Supremo tem mais poder que os outros poderes, membros de outros poderes têm o rabo preso e precisam da simpatia dos ministros do STF”, prossegue o jurista, que completa. “O STF hoje é meio de realização de políticas públicas.”