Prometido há mais de uma década, o campus da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), em Santo Amaro (BA), nunca saiu do papel. O terreno, doado em 2012 e localizado ao lado das ruínas da histórica Fundição de Aço Tarzan, foi oficialmente retomado pelo município este ano depois que um projeto apresentado pela própria prefeitura foi aprovado pela Câmara Municipal, sob a justificativa e acusação de que a instituição não deu devida atenção ao espaço. Agora, o que seria um campus universitário pode ser redirecionado para atividades econômicas.
O Metrópoles descobriu que a construção do campus, que de fato nunca foi erguido no terreno doado, foi contemplada pelo extinto Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Cidades Históricas de 2013, do governo federal, devido à proximidade com a antiga Fundição Tarzan – considerado de relevância histórica pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac).
Entretanto, o programa do governo, que foi encerrado em 2017 antes que a obra do campus pudesse ser iniciada, “em razão da indisponibilidade orçamentária”, desapareceu do mapa sem muitos vestígios.
A restauração da ruína Tarzan e a implementação do campus não foram as únicas obras de preservação de patrimônio cultural e artístico nacional não concluídas pelo PAC Cidades Históricas. Dos mais de 400 projetos selecionados pelo programa do governo federal, divididos em 44 cidades do país, apenas 56 ficaram prontos até 2018.
Rita Dias, diretora do Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas (Cecult) da UFRB, a quem pertencia a terra doada, nega que a Universidade não fez jus à doação de terra e atribuí a ausência do campus em Santo Amaro à falta de investimento público.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Educação afirma que tomou conhecimento da revogação do terreno doado para a construção do campus do Cecult e que, considerando a importância da presença da instituição no município, está em diálogo com a Administração Superior da UFRB e parlamentares para reverter a decisão e garantir a obra.
PAC Cidades Históricas
A professora Renata Gomes, que chegou à UFRB em 2015, lembra que havia grande expectativa com o projeto. “Achávamos que estávamos numa sede provisória, porque o campus na Tarzan seria construído com o dinheiro do PAC. Havia conversas com o Iphan e com ministérios. Mas tudo foi se dissolvendo.”
Ela explica que o projeto foi iniciado no governo Dilma, congelado sob Temer e não retomado na gestão Bolsonaro. “Não recebemos dinheiro nenhum para isso e a construção do campus, no âmbito desse projeto – que era o inicial – nunca foi levado adiante.” Hoje, o Cecult funciona de forma improvisada em escolas municipais cedidas pela prefeitura. Desde 2017, ocupa o Colégio Pedro Lago, com apenas 11 salas de aula para sete cursos de graduação, além de mestrado e pós. Salas são divididas entre docentes e alunos por meio de acordos internos.
Em 2013, 44 cidades de todo o país foram selecionadas, com um investimento total de R$ 1,6 bilhão, para o PAC Cidades Históricas (PAC CH).
Na Bahia, além de Santo Amaro, Salvador, Maragogipe e Itaparica também foram contempladas com projetos que tinham como objetivo “recuperar o patrimônio cultural nos centros históricos, tornar o patrimônio cultural eixo indutor na geração de renda e agregação social e a afirmar a identidade da cidade histórica”.
À reportagem, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) explicou que a construção do campus da UFRB no terreno em questão havia sido contemplada pela Portaria 383 de 20 de agosto de 2013 do PAC CH.
A partir da publicação dessa portaria, o projeto entrou na fase de Ação Preparatória, que consiste na elaboração do Termo de Referência, que foi entregue pela UFRB ao órgão.
“À Prefeitura, competia a regularização fundiária e desocupação de áreas invadidas no terreno, processo que constitucionalmente compete ao poder público municipal e que se prolongou até ser concretizado”, esclaresse o Iphan. Os estudos para a construção do campus foram interrompidos em 2017 com o fim do PAC Cidades Históricas, “em razão da indisponibilidade orçamentária.”
O Instituto acrescentou, por fim, que a execução de obras desse porte depende de licitações, verbas e articulação entre vários entes públicos, o que travou o projeto.
A implementação do Campus da URFB juntamente da restauração da Fundição de Aço Tarzan, entretanto, não foi a única obra contemplada pelo PAC Cidades Históricas a não ser entregue. De acordo com dados de 2018 divulgados pelo Ministério do Planejamento, apenas 56 dos 422 projetos selecionados em 2013 para a preservação do patrimônio cultural e artístico nacional ficaram prontos.
O investimento recebido foi de apenas R$ 159 milhões, bem abaixo do R$ 1,6 bilhão anunciado originalmente: cerca de 10% de quando o plano de investimentos foi lançado.




Ruína da Fundição de Aço Tarzan
Jack Flies Drones
Ruína da Fundição de Aço Tarzan
Jack Flies Drones
Ruína da Fundição de Aço Tarzan
Jack Flies Drones
Ruína da Fundição de Aço Tarzan
Jack Flies Drones
Ao Metrópoles, o Iphan afirma que, na verdade, mais de 100 obras teriam sido concluídas e 144 projetos executivos, que serviram como base para o Novo PAC, entregues.
O Novo PAC, foi lançado em 2023 pelo Governo Lula e tem como objetivo principal promover o crescimento sustentável por meio de investimentos massivos em infraestrutura. Através do novo programa, o Iphan afirma estar destinando mais de R$ 771 milhões para a execução de 249 ações de preservação do patrimônio cultural em todo o Brasil.
Em Santo Amaro, a restauração das ruínas da antiga Fundição Tarzan e a implementação do campus da UFRB foi esquecida. No município, o novo projeto prevê apenas a restauração do Centro Cultural da Casa do Samba.
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Fundição de Aço Tarzan
De acordo com o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac), as ruínas da Fundição de Aço Tarzan são consideradas de relevância histórica, porém o estudo de elaboração do parecer técnico preliminar para que a fábrica seja tombada ainda está em fase inicial, sem prazo para elaboração do parecer preliminar e do dossiê.
A Fundição de Aço Tarzan foi fundada em 1945 e é considerada uma das primeiras siderúrgicas do nordeste. A empresa esteve sediada no município de Santo Amaro durante cerca de quinze anos e encerrou suas atividades no início da década de 1960.
Veja imagens feitas por drones da antiga Fundição de Aço Tarzan: